Na Bíblia Hebréia há uma divisão tripartida dos seus livros: Leis, Profetas e Escritos. No Antigo Testamento Cristão encontramos: Pentateuco, Livros Históricos, Poesia, Sabedoria e Profetas. A ordem exata se detalha na tabela:
Para os estudantes a linguagem das Escrituras Hebraicas, assim como a sua condição no Canon, desempenham um papel essencial para a Exegese. O idioma do corpus literário que é 99% hebraico e menos de 1% aramaico, é um motivo muito importante para se aprender o Hebraico Bíblico.
Existem algumas diferenças da Bíblia Hebraica entre os judeus e cristãos no conteúdo e na ordem dos livros. É por isso que ao se fazer a exegese da versão hebraica, nos deparamos com discrepâncias da versão cristã. Também resolvemos divergências de textos, como aconteceu no post sobre o Arrependimento de D'us.
Outra área de frequente dificuldade envolve os vários nomes de D'us. A convenção seguida pela Septuaginta é sempre traduzir o tetragrama como "Senhor", e El'him como "D'us". Isso no entanto, muitas vezes produz resultados de difícil entendimento. A seguir um exemplo:
Diferenças de Salmos 110.1-2
Versão cristã:
"Disse o Senhor (1) ao meu Senhor (2): Assenta-te à minha direita, até que ponha os teus inimigos por estrado dos teus pés. O Senhor (3) enviará de Sião o cetro da tua fortaleza; dominarás no meio dos teus inimigos."
(tradução baseada em João Ferreira de Almeida, Edição Contemporãnea, Editora Vida)
Não conseguimos definir claramente aqui quem é quem no Senhor 1,2 e 3. Não sabemos definir também se o Senhor 3 se refere ao 1 ou ao 2 do versículo anterior.
Versão Judaica:
" As palavras do Senhor(1): Ao Meu mestre(2), espera à Minha direita; até que Eu faça de teus inimigos um escabelo para teus pés. O pão de tua força o Senhor(3) enviará de Sião. Governa entre teus inimigos!"
(Tradução de Adolpho Wasserman e Chaim Szwertszarf em "Tehilim" , McKlausen Editora)
Embora não seja uma tradução literal, pelo menos é contextualizada, nos dá uma noção de diferenças de pessoas, pois o Tetragrama não é traduzido nas duas. Assim, 1 refere-se ao Tetragrama, 2 à Adonai (literalmente 'Senhor') e 3 ao Tetragrama. Conseguimos compreender assim que o Senhor número 3 é a mesma pessoa do 1 e que está em hierarquia de poder superior ao 2.
Causas das diferenças nos Textos
O judaísmo contemporâneo deriva do movimento farisaico, que teve dois principais centros de estudos: Palestino e Babilônico. A literatura religiosa que veio dessa época está toda escrita sobre o texto hebraico e aramaico. Estas comunidades, palestina e babilônia, utilizaram a versão hebréia da Bíblia, conhecida mais tarde como Texto Massorético.
A religião irmã do judaísmo, o cristianismo, não estava centrado na etnia, mas acolhia os adeptos de todas as nações. Dada a rápida difusão do cristianismo no mundo de fala grega, é lógico que foi mais fácil o uso do texto bíblico em grego. Assim, foi difundida a escrita Septuaginta (LXX), que de acordo com a tradição, foi traduzida por 70 eruditos judeus. O Talmud da Babilônia comenta sobre 72 anciãos que traduziram a Torah de forma independente, sem nenhum tipo de diferença. Seja qual for a verdade que se esconde nessa tradição, a sessão da Torah na Septuaginta é uma das melhores traduções. A maioria dos estudiosos acham que a Torah foi traduzida ao grego por volta do século III a.C. e os demais livros, nos séculos seguintes.
Inicialmente, a Septuaginta contribuiu para que numerosos judeus de fala grega da Diáspora, como os de Alexandria no Egito, pudessem ser capazes de ler o texto bíblico. Entretanto, uma grande redução da população judia no mundo de fala grega e o uso da Septuaginta pelos cristãos no séculos II fizeram com que lentamente esta se tornasse parte da Bíblia cristã.
Nos agitos do cristianismo, a Septuaginta cumpriu o papel muito importante, mais que o Texto Massorético. Numa generalização histórica, podemos dizer que os precursores do judaísmo moderno utilizaram o Texto Massorético, enquanto no cristianismo, a Septuaginta desempenhou um papel mais destacado.
O uso do Texto Massorético e o da Septuaginta, respectivamente, pelo judaísmo e pelo cristianismo é o motivo da diferença na atual ordem dos livro canônicos, o que se reflete também nas traduções em português. Porém, o conteúdo geral é o mesmo.
Bibligrafia:
Stefan Bosman; The Biblical Hebrew team; ClassicalHebrew Newsletter.
A Torá Viva; anotado por Rabino Aryeh Kaplan; Ed. Maayanot, 2ª ed.,2003.
Estudos Linguísticos do Hebraico Bíblico: Prof. ª Gláucia Vilela.